terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Verdes querem produção alimentar local nas cantinas públicas

Verdes querem produção alimentar local nas cantinas públicas

Discute-se amanhã, dia 11 de Dezembro, na Assembleia da República, o Projeto de Lei dos Verdes “Preferência pela produção alimentar local nas cantinas públicas”.

Com esta iniciativa legislativa, o PEV propõe que, no mínimo, 60% de produtos alimentares utilizados para confeção das refeições das cantinas públicas sejam obrigatoriamente de origem nacional. Através desta regra – que se aplica às cantinas ou refeitórios dos serviços e organismos da Administração Pública, central, regional e local, bem como dos institutos públicos que revistam natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos - o Estado contribuirá, por via das suas compras públicas, para garantir o escoamento da produção alimentar nacional.

A proposta dos Verdes - discutida amanhã, dia 11 de dezembro, em plenário da Assembleia da República - trará diversas vantagens ao país, tanto de ordem económica, social, ambiental, como cultural e de segurança alimentar, tais como o combate a défice agro-alimentar, a dinamização da economia nacional, a redinamização do setor pesqueiro, o combate ao despovoamento e à desertificação do mundo rural, a preservação da biodiversidade agrícola e o combate às alterações climáticas.

10 de dezembro de 2015

 
PROJETO DE LEI N.º 13/XIII/1ª

PREFERÊNCIA PELA PRODUÇÃO ALIMENTAR LOCAL
NAS CANTINAS PÚBLICAS


Nota justificativa

A dependência alimentar do exterior é bastante acentuada no nosso país, ultrapassando os 70% das necessidades alimentares dos portugueses. A integração europeia contribuiu significativamente para a extinção de muitas unidades produtivas agrícolas em Portugal, tornando, assim, necessária uma maior importação de alimentos, com grave prejuízo para a nossa balança comercial. A delapidação da nossa actividade produtiva foi a machadada na nossa fonte de riqueza, tornando-nos mais permeáveis ao endividamento e à dependência externa.

Esta situação só poderá ser invertida com a retoma da produção alimentar nacional e a dinamização do nosso mercado interno. Uma questão pela qual o PEV se bate há muito e que implica incentivos sérios à produção sustentável e ao escoamento dos produtos deles resultantes. Esta questão depende, de entre outras, de duas variáveis determinantes: (i) devolução de poder de compra à grande massa do povo português (através designadamente do desagravamento dos impostos do trabalho e da reposição de salários e pensões), (ii) criação de condições para que os produtores, sobretudo os micro e pequenos agricultores, encontram no mercado interno oportunidades de escoamento dos seus produtos.

Estes são passos decisivos para combater o défice, o endividamento e para atenuar a gravidade de uma situação económica que tem custos sociais bastante dramáticos. Torna-se, portanto, mais que urgente uma política económica que assuma como prioridade a redinamização do nosso sector produtivo, nomeadamente do sector alimentar.

E é justamente no sector alimentar que o país, com menor esforço, pode redinamizar o mercado interno e reactivar a economia, gerando emprego, porque temos recursos naturais, solo, água, mar, clima, infraestruturas dispersas pelo território (desde adegas, lagares, unidades de indústria transformadora, portos, docas, mercados, entre tantas outras coisas que aqui se poderiam enumerar), saber ancestral, a par da inovação e do empreendedorismo, mão-de-obra qualificada... tudo o que constitui um potencial extraordinário que tem sido, inqualificável e inaceitavelmente, desprezado.

A agricultura e as pescas portuguesas, pilares fundamentais da alimentação, sofreram impactos negativos de grande amplitude, para os quais não foram alheias a Política Agrícola Comum e Política Comum de Pescas, ao nível comunitário, mas também os acordos comercias da OMC (Organização Mundial do Comércio). O facto é que, nas últimas décadas, o mercado alimentar nacional foi invadido pelas importações e os nossos produtos foram em grande medida excluídos e muitos banidos do mercado.

A agricultura familiar e a pesca de pequena dimensão sofreram uma destruição absolutamente inaceitável, que levou quase à liquidação do sector primário em Portugal, o qual foi durante anos uma base fundamental de emprego e de ocupação do território. Só para exemplificar, nos últimos 20 anos desapareceram mais de 300 mil pequenas explorações agrícolas em Portugal, com graves repercussões para o mundo rural e para a liquidação de emprego, fomentando exactamente o contrário daquilo que o país precisava e precisa.

Os Verdes” apelam, desde há muito, ao engrandecimento da produção e do consumo locais, em função das necessidades e da racionalidade de gestão dos recursos naturais, tendo em conta todos os benefícios de ordem ambiental, social, económica, cultural e de qualidade e segurança alimentares daí decorrentes. O PEV já lançou, inclusivamente, algumas campanhas específicas sobre a temática, e desenvolveu iniciativas legislativas tendentes a contribuir directamente para este objectivo. É justamente a mesma motivação que nos leva à apresentação do presente Projeto de Lei.

Pôr o país a produzir na área alimentar, de modo a garantir uma grande parte da nossa auto-suficiência é determinante. Não chega apelar aos consumidores para consumir nacional, é preciso alargar os mecanismos que venham a garantir o escoamento dos produtos locais, designadamente assegurando que todos nós, em conjunto, como Estado, sigamos também esse desígnio. Com efeito, ao Estado compete também exemplificar e tornar-se modelo de comportamentos e, mais, contribuir para fomentar o que faz extraordinária falta ao país.

Assim sendo, o Grupo Parlamentar “Os Verdes” propõe, através do presente Projecto de Lei, que, no mínimo, 60% de produtos alimentares utilizados para confecção das refeições das cantinas públicas sejam obrigatoriamente de origem nacional. Através desta regra, o Estado contribuirá, por via das suas compras públicas, para garantir o escoamento da produção alimentar nacional.

As vantagens a retirar da regra agora proposta pelo PEV são diversas:

  1. Ao nível económico trata-se de uma medida que combate o défice agro-alimentar do país, que pode representar, no ano corrente, mais de 4 mil milhões de euros, bem como o défice da nossa balança comercial; para além disso, o Estado contribuirá para dinamizar a economia nacional, sem sobrecarregar o Orçamento de Estado, na medida em que essa despesa já existe, sendo agora convertida para o estímulo à economia nacional; mais, esta medida contribui para nos proteger da volatilidade dos preços dos produtos alimentares nos mercados internacionais.

  1. Ao nível social, a concretização desta proposta terá consequências no combate à desertificação rural, pois favorece a manutenção de uma actividade económica que gera emprego, e de uma agricultura familiar que, mesmo sem ter capacidade de exportação, pode garantir o fornecimento de uma parte importante dos produtos básicos à nossa alimentação; para além disso, beneficia igualmente a segurança e a estabilidade dos rendimentos agrícolas. Esta proposta permite ainda redinamizar o sector pesqueiro e combater a pobreza que pesa cada vez mais sobre este sector.


  1. Do ponto de vista ambiental, a proposta do PEV tem uma relevância muito significativa, desde logo porque o despovoamento e a desertificação do mundo rural têm graves repercussões ambientais, de todos conhecidas, que seriam contrariados com a dinamização da agricultura; mais, o favorecimento e a preservação da biodiversidade agrícola é também uma evidência, assim como de componentes paisagísticas; mas esta medida é também um contributo para o combate às alterações climáticas e para menores gastos energéticos, uma vez que ao relocalizar o consumo de produtos alimentares, estamos a tornar esse consumo menos dependente de transportes, o que promove menor emissão de gases com efeito de estufa.

  1. A segurança alimentar está constantemente a ser posta à prova, e tantas vezes tem falhado com repercussões graves para o mundo, regra geral com origem na produção intensiva de larga escala. A segurança dos alimentos é também um fator que o PEV tem em conta com este Projeto de Lei - o facto é que a agricultura familiar e a produção alimentar de proximidade tem dado provas de apresentar um grau de segurança superior e de garantir uma qualidade no produto muito superior, sendo até mesmo muito mais fácil o controlo de situações de risco para a saúde pública, em caso de falhas.

  1. Não seria justo elencar um conjunto de vantagens resultantes da concretização deste Projecto de Lei sem fazer referência ao vasto património cultural, nomeadamente gastronómico, que esta produção alimentar de proximidade gerou ao longo do tempo e que continua a gerar. Este é também um pilar de dinamização da economia local e regional, através do interesse turístico que gera.

Estas são apenas algumas das consequências desejáveis, advenientes do contributo que a proposta do PEV pode dar, caso seja implementada em Portugal. Pôr as cantinas públicas a consumir local, contribuindo para a dinamização da agricultura de pequena escala, da pesca e para a sustentabilidade das empresas transformadoras, relocalizando o consumo alimentar é um contributo extraordinariamente positivo, especialmente no momento que Portugal atravessa.

Esta lógica de consumo de origem local, com o objectivo de dinamização das economias locais, tem já precedentes de sucesso noutros países, como em Itália e no Brasil, onde estão traçadas regras de consumo de produções locais, regionais e nacionais com origem em actividades produtivas de pequena escala que garantem melhor qualidade alimentar em cantinas públicas.

Importa também salientar de que cantinas estamos a falar, para aplicação do princípio “consumir local”: estamos a tratar de todas as cantinas e refeitórios públicos, sejam eles escolares no âmbito do ensino obrigatório, sejam eles do sistema de acção social escolar do ensino superior, sejam de estabelecimentos prisionais, sejam de unidades hospitalares, sejam de serviços sociais da Administração, em suma, a ideia é abranger todas as cantinas e refeitórios dos serviços e organismos da Administração pública, central, regional ou local, bem como dos institutos públicos que revistam natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos.

Assim, com os objetivos acima traçados, o Grupo Parlamentar Os Verdes apresentam, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o seguinte Projeto de Lei:


Artigo 1º
Objecto
O presente diploma determina a utilização de, pelo menos, 60% de produtos alimentares de origem local nas cantinas públicas, com vista à dinamização da produção local, com todos os benefícios associados de ordem ambiental, social e económica.


Artigo 2º
Âmbito
A regra determinada no artigo anterior aplica-se às cantinas ou refeitórios dos serviços e organismos da Administração Pública, central, regional e local, bem como dos institutos públicos que revistam natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos.





Artigo 3º
Princípios
1.Na aquisição de bens alimentares para confeção de refeições nas cantinas públicas dá-se preferência aos produzidos na região de implantação da respetiva unidade de restauração e, se o fornecimento não for possível, dá-se preferência a produtos alimentares produzidos no país.
2. A impossibilidade de fornecimento à escala traçada no número anterior deve ser devidamente sustentada, por método a definir pelo Governo.
3. A aquisição de produtos alimentares em cantinas públicas tem em conta a diversificação e o equilíbrio das dietas alimentares.
4. Por produção regional ou nacional entendem-se os bens alimentares que tenham sido produzidos, em todas as suas fases de produção, na escala de circunscrição territorial respetiva.

Artigo 4º
Percentagem
A percentagem referida no artigo 1º do presente diploma é aferida em função dos montantes despendidos na aquisição dos produtos alimentares por unidade de cantina.


Artigo 5º
Fiscalização
A fiscalização do cumprimento do estabelecido no presente diploma compete à Autoridade de Segurança Alimentar e Económica.


Artigo 6º
Relatório anual
Com o objectivo de conhecer e tornar público os efeitos sobre as economias locais da aplicação do presente diploma, o Governo elabora um relatório anual que relate o comportamento da totalidade das cantinas públicas em cumprimento das regras determinadas na presente lei.



Artigo 7º
Regulamentação
A regulamentação do presente diploma é feita pelo Governo no prazo de 100 dias.


Artigo 8º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor 60 dias após a sua publicação.


 
Assembleia da República, Palácio de S. Bento, 3 de novembro de 2015


Os Deputados


Heloísa Apolónia José Luís Ferreira

 

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